Empreendedorismo como campo de estudo
- Júnior Rodrigues
- 14 de abr. de 2013
- 5 min de leitura
Esse post é uma reflexão sobre o tema empreendedorismo e tem como base principal o texto de Scott Shane “Reflections On The 2010 AMR Decade Award: Delivering On The Promise Of Entrepreneurship As A Field Of Research”, e mais alguns textos que abordam a área com diferentes visões.

O texto se preocupa em discutir uma questão central: É factível um campo de pesquisa dedicado a estruturar a arte e ciência de empreender? E essa discussão se desenrola a partir da influência que o artigo original, “The Promise of Entrepreneurship As a Field of Research” publicado por Shane e Venkataraman em 2000 e premiado pela AMR (Academy of Management Review) como Artigo da Década, teve no campo do empreendedorismo.
Além disso, busca destacar os conceitos aceitos pelos teóricos e os que têm sido contestados, esclarecendo os pontos abordados de forma superficial e corrigir erros do artigo, ao discutir como o campo evoluiu após uma década de sua publicação. Cabe observar que o texto original foi citado por mais de 2000 artigos, conforme pesquisa realizada no Google Academy.
Shane primeiramente relembra as 4 dimensões discutidas no artigo original, que são:
Discussão do empreendedorismo como um domínio acadêmico distinto, com sua própria pesquisa e teorias
Definição de empreendedorismo como um processo e não um evento ou personificação individual
Discussão sobre a relação entre oportunidades e indivíduos
Discussão de relações meio-fim, inovação e novas combinações de recursos
Campo de Pesquisa Distinto?
O texto ressalta que no início dos anos 2000, havia uma falta de paradigma para a área, que contava com uma miscelânea de visões e conceitos amplos e diferenciados. Havia, portanto, uma necessidade de fornecer uma estrutural processual capaz de explicar e prever fenômenos não apontados por outra área de estudo.
Um grande obstáculo para esse trabalho era (ou ainda é) justamente o limite tênue entre Empreendedorismo e outras áreas, em especial a Gestão Estratégica. Havia uma falta de consenso sobre as diferenças, uma vez que, segundo alguns críticos, a Gestão estratégica explicaria grande parte do Empreendedorismo.

Shane ressalta, porém, que ambas representam dois lados da mesma moeda: Da criação e obtenção de Valor. Entretanto, há a necessidade de claramente identificar as teorias e premissas únicas ao Empreendedorismo. E nesse ponto, os argumentos do artigo original aumentaram a chance de consenso e legitimação do campo de pesquisa, uma vez que passou a ser referência para todos os estudos desde então.
Segundo o autor, as principais diferenças entre as duas áreas ocorrem em cinco dimensões:
Dimensão - Empreendedorismo X Gestão Estratégica
Resultado - Riqueza Social e Satisfação Individual X Performance da Organização
Organização - Independe X Firma
Performance - Relativa às alternativas do indivíduo ou grupo X Relativa às outras organizações
Esforço - Identificar e explorar oportunidades X Desenvolver e manter vantagem competitiva
Ações - Organizar empresa, parte legal e recursos X Estratégicas
Perspectiva processual
Dentre as dimensões apontadas, é válido destacar a que se refere ao Esforço, pois é a que mais claramente diferencia e é o cerne conceitual das duas áreas. Enquanto a Gestão Estratégica tem um foco no Desenvolvimento e manutenção da vantagem competitiva, o Empreendedorismo se destaca pela Identificação e exploração de oportunidades.
O que é Empreendedorismo?
Seguindo as dimensões propostas por Shane e que diferenciam as duas áreas de estudo, o Empreendedorismo seria definido conceitualmente, então, como o Processo de Identificação, Avaliação e Exploração de Oportunidades.

Embora muitos teóricos associem o Empreendedorismo à Formação de Empresas (definição que passou a se utilizar operacionalmente), Shane ressalta que essa visão pode limitar o campo de estudo. A Formação de uma Empresa, portanto, seria uma das formas que o indivíduo pode escolher para explorar uma oportunidade identificada.
Para Shane, o Empreendedorismo não é fruto somente de características de um indivíduo, mas um processo que pode, entretanto, não ser uma sequência planejada, ordenada e aplicável a todos indivíduos e situações. Suas etapas podem ocorrer de forma não intencionalmente deliberada pelo indivíduo ou até em paralelo.
Porém, ele destaca que há ainda muito que explorar no campo de pesquisa sobre:
• Como um indivíduo identifica uma oportunidade, cria uma ideia de negócio e a avalia.
• Como a formulação da ideia e a dificuldade e risco inerente em buscar a oportunidade influenciam na decisão de explorá-la.
Ligação entre Indivíduo e Oportunidade
O argumento do texto original deixa clara a importância da oportunidade que será explorada e não somente do indivíduo. E introduz o conceito de Oportunidades Empreendedoras, que são aquelas em que novos bens, serviços, materiais primários e métodos de organização têm a possibilidade de ser introduzidos e vendidos em valor maior que seu custo de produção.

É destacada, ainda, a questão do foco excessivo existente no meio a respeito das características individuais que, segundo Shane, ainda são superestimadas. O núcleo central do empreendedorismo é a exploração de oportunidades, mesmo que a geração de lucro não ocorra de fato e que se tenha um empreendedor mal sucedido.
Influência do ambiente
Fatores objetivos como avanço científico, mudanças políticas, regulatórias, demográficas e sociais, tornam possível a introdução de novas e potenciais combinações rentáveis de recursos. O artigo original teve um foco no empreendedorismo como atividade em si, fruto de um pensamento individual a respeito de alguma oportunidade identificada, pois na época muita atenção estava voltada para influência das condições do ambiente.
Relações meio-fim, inovação e recombinação
O Empreendedorismo envolve a criação de novas ou levemente diferentes relações meio-fim (método para alcançar resultado), ao recombinar os recursos. A Inovação ocorre ao recombinar recursos de forma diferente que outros fazem, mesmo não sendo uma ideia ou área de negócio nova.
Em adição, Shane destaca o Papel do Líder como peça chave para a exploração de oportunidades, através da habilidade de combinar os recursos para realizar todo o potencial que a organização possui.
Empreendedorismo Estratégico
Seguindo na linha oposta à de Shane, que buscava dissociar o Empreendedorismo da Gestão estratégica, Hitt et al introduziram o conceito de Empreendedorismo Estratégico (no artigo Strategic Entrepreneurship: Creating Value for Individuals, Organizations, and Society - 2011).
Esse conceito busca combinar a contribuição das duas áreas para a formação de um novo campo de estudo, uma vez que objetivo comum é a criação de valor. O foco das organizações seria na manutenção da vantagem competitiva em conjunto com a exploração de novas oportunidades.
Através do Empreendedorismo Estratégico, seria possível obter a geração de riqueza para os envolvidos e toda a sociedade, com a busca de vantagem somada à novas oportunidades resultando na criação de valor. Entretanto, a exclusão de um desses fatores poderia levar à ineficiência na organização.

Empreendedorismo X Gerenciamento
Complementando a ideia de se consolidar o Empreendedorismo como um campo de pesquisa, Fillion, em seu texto “EMPREENDEDORISMO E GERENCIAMENTO: processos distintos, porém complementares”, faz um comparativo com o Gerenciamento, destacando os aspectos da evolução de uma Formação Empreendedora e como estes se confundem com o ensino da Gestão.
Fillion estabelece uma série de características que diferenciam as duas áreas e que o Empreendedorismo precisa de um ensino diferenciado e direcionado para o perfil específico do empreendedor.
Embora se possa questionar se o Empreendedorismo e suas características podem ser ensinados, o fato é que um crescente número de cursos de extensão e disciplinas em cursos universitários está sendo disponibilizado, conforme matéria da Exame sob o título “Empreendedorismo ganha espaço nas universidades”.
A matéria destaca o programa do Sebrae, iniciado em 2010 com seis instituições conveniadas, que foi ampliado para catorze universidades através de quatro iniciativas opcionais: criação de uma disciplina de empreendedorismo; utilização de uma ferramenta virtual de ensino; estímulo a pesquisas na área; e licenciamento para as escolas utilizarem a metodologia Sebrae. O programa beneficiará cerca de dezesseis mil alunos.
Conclusão
A discussão sobre o Empreendedorismo, as características do Empreendedor, a delimitação do campo de estudo, entre outros aspectos, é bastante controversa, porém obteve um grande avanço nos últimos anos, sobretudo a partir do texto de Shane e Venkat.
Sendo assim, seja através de uma formação empreendedora ou de um autodesenvolvimento profissional, bem como do ferramental disponível a respeito, é importante se conhecer as características e o processo de empreender, com o intuito de maximizar a chance de sucesso na exploração de oportunidades empreendedoras.
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